quarta-feira, 22 de julho de 2020

Tamanho de mim

Somos medidos por tantas coisas... quais realmente importam?

 

Fulana é uma ótima profissional!

Beltrana é uma mãe maravilhosa!

Cicrana é a esposa perfeita!

Fulana é uma boa amiga.

Beltrana é uma filha exemplar.

Cicrana é uma super atleta.

Fulana é tão generosa...

Beltrana é linda e vaidosa, né?

Cicrana é muito inteligente!

 

Quais desses adjetivos se aplicariam a mim? Em quais me reconheço? Quanto de mim é cada coisa que podem dizer que sou, ou que não sou?

Não sei, nem sei se importa.

 

A maior parte do tempo eu me sinto eu. Tenho um contato frequente e refletido comigo, me alimento do meu silêncio e me acalento em minha própria companhia. Sou o que chamam de introvertida, introspectiva. Minha terapeuta diz que isso é profundidade. Nesses não raros momentos de estar só eu comigo, tudo o mais, o de fora, os rótulos, tudo que não sou eu mesma em mim é supérfluo e pequeno.

 

Daqui de mim avalio alguns adjetivos, e todos são completamente parciais. Acho que sou boa profissional, mas estou escrevendo isso ao invés de mandar para a chefa um e-mail de atualizações dos trabalhos da semana. Acho que sou boa mãe, mas tantas vezes sinto culpa, perco a paciência, mimo demais ou de menos. Sou boa esposa? Aqui tenho particularmente dificuldade em me avaliar... Achava que era boa amiga, porque adoro ouvir e evito dar conselhos, mas estou tão distante de quase todas as pessoas que mais tenho amor e amizade, que só posso me sentir uma amiga bem fajuta... E boa filha, sou? Depende da hora e da expectativa, tenho certeza. Sou meio desgarrada, e neguei tantas vezes o modelo que minha mãe tentou me passar... não deve ser tão fácil assim ser pai e mãe de mim. Atleta não sou, nunca fui (fingi ser por pouco tempo, e foi bem sofrido pra mim). Generosa? Sei não... Linda, vaidosa? Também deixo bastante a dever aqui, não por não considerar a beleza algo importante, mas porque prefiro ler livros, e brincar com minhas filhas, e conversar com quem amo, e ficar eu comigo, mais um pouco, eu comigo bem quieta por fora. Sou inteligente? Talvez, para o que me interessa. Gosto do que penso e sinto, que é tanto do que sou, gosto do que considero inteligência em mim, e sei que sou uma negação para conteúdos que demandam navegar numa cronologia e gravar nomes de pessoas e eventos (assim, geografia, história e política são coisas que não deixam memórias em mim, e me fazem sentir sem inteligência a cada vez que tento entrar em contato).

 

Meu tamanho é esse tamanho de mim mesma em mim. Não é pequeno, nem é grande. Na verdade, varia o tempo todo. E está bom assim.


quinta-feira, 16 de julho de 2020

O ilimitado absurdo

"Brasil chega a 2 milhões de infectados pelo novo coronavírus

País registrou 43.829 novas infecções e 1.299 mortes nesta quinta (16); total de óbitos chega a 76.822, mostra consórcio de imprensa"


Manchete de hoje do jornal Folha de São Paulo. 

Desses dois milhões de infectados, um é o presidente da República. O bolsonaro. Outra é minha tia. Outros 4, meu colega de SP, a esposa e os dois filhos. O pai de uma amiga-professora integra os dois milhões e os 76.822, assim como pessoas queridas de pessoas queridas minhas... 

Estamos há dois meses sem Ministro da Saúde. O último não havia durado um mês.

Temos recordes de desmatamento, queimada, assassinatos cometidos por policiais.

O ex-Ministro da Educação fugiu do país usando seu passaporte oficial, depois foi retrospectivamente exonerado. Ficamos um tempo sem, o novo assumiu hoje... a ver.

O advogado atual da família do presidente estava há um ano "escondendo" (ou mantendo em cárcere, vai saber) o miliciano amigo da família do presidente que está sendo investigado por crimes de corrupção no RJ (rachadinhas), mas que também era do escritório do crime e assassinou muita gente, mesmo enquanto era policial militar, antes de ser expulso junto com outro grande amigo policial corrupto e assassino que também se tornou miliciano, e que também estava escondido, mas que foi assassinado no início desse ano. 

Li em junho um livro muito bom chamado "As sobras de ontem", de Marcelo Vicintin. Um trecho em especial, que colo abaixo, me pareceu um retrato do Brasil em 2020. 

"A segunda lei da termodinâmica, uma das (poucas) leis fundamentais que regem nosso universo, descreve o processo de entropia, a partir do qual sistemas organizados tendem a dissipar sua energia gradualmente, rumo ao caos e à dissolução do sistema original. Isso não ocorre para criar algo novo e melhor, mas simplesmente para desmontar a ordem vigente. Uma vez estabelecido o caos, não há nenhuma lei (fundamental ou não) que sugira uma reconstrução da ordem perdida ou de alguma nova ordem. A entropia age de maneira unidirecional. E a direção é o caos."
 
Será que o fundo do poço está longe, tarda? Assistimos passivamente, uns mais que outros, o desmonte de uma nação. É triste.

Sem a pandemia já seria triste. Mas tem a pandemia. E não tem governo pensando em resolver como minorar os efeitos dela. Nos outros países (tirando EUA, caso à parte e modelo do presidente), depois do pico se iniciou a queda. No Brasil, temos um platô, exibindo ao mundo nossa total incompetência. 

A direção é o caos...

Aniversário da pandemia!

  Brasil. Pandemia. Vai fazer um ano... um ano de isolamento. Um ano de crianças sem escola, um ano de homeoffice . Um ano agradecendo que n...